CARL ROGERS E O SELF
Ao contrário do que se costuma pensar há uma grande diferença entre a palavra Self e selfie. Esta última é muito usada no momento por celebridades e ilustres anônimos e não tem qualquer relação com o Self. A expressão inglesa pode significar “Eu”, “si mesmo”, “personalidade”, “natureza” e até “caráter”. Sendo assim tirar uma selfie significa fotografar a própria imagem, porém a fotografia, assim mesmo, não irá captar seu Self.
Para Carl Rogers, que propôs uma psicoterapia numa perspectiva Centrada no Cliente, “o Self não é uma entidade estável, imutável” (FADIMAN; FRAGER, 1986). Ou seja, para ele o Self é um processo constante e não pode ser comparado a uma fotografia que apenas congela o momento. Rogers queria que o indivíduo entrasse em contato com sua identidade, iniciando assim seu autoconhecimento e de forma contínua.
Por outro lado o autoconhecimento não deve ser confundido com a tal da Reforma Íntima. Reforma se faz em casa e apartamento, em sofá, até na garagem, ou quando chega o fim de ano, resolve-se passar uma mão de tinta barata no muro e depois que chega o inverno chove e a tinta cai, mostrando as texturas dos anos anteriores. Isto, na verdade, poderia ser comparado com as máscaras das representações sociais que o indivíduo usa. O desconforto se agrava na vida psíquica do indivíduo por ele não conseguir conciliar seu Self real com seu ideal. E neste mundo virtual de Photoshop o que não falta em revista masculina e em Facebook, é a busca pela selfie ideal. Quanto maior for o afastamento da própria realidade mais se gera incongruência entre o Self real e o Self ideal, e consequentemente mais o indivíduo neurotiza, tornando-se infantil, dificultando o seu amadurecimento psicológico.
Para Rogers o autoconhecimento só é viável quando se entra em contato com o Self, sem subterfúgios ou dissimulações. Entretanto, o problema reside neste fator. O Homem não consegue ser autêntico ou, como Rogers definiria, “congruente”. Para ele pessoas congruentes são mais felizes, pois aliam o autoconceito, o que sabem de si mesmas e se aceitam como são, com o discurso e o comportamento (experiência). Veja por exemplo as crianças como são congruentes com o que pensam e falam (FADIMAN; FRAGER, 1986).

Também não se deve confundir “aceitar-se” com “zona de conforto”, “comodismo” ou em expressar a natureza primitiva sem a mínima “regra de civilização”, como bem definiu Freud. Atualmente, este comportamento é chamado de Síndrome de Gabriela: “eu nasci assim, eu vivi assim, e sou mesmo assim, vou ser sempre assim, Gabrieeeela…”
Já os incongruentes negam, frequentemente, o que sentem. Isto se aplica tanto aos homens quanto às mulheres. Ciúme, por exemplo, é um sentimento que geralmente é trocado por quem o sente por outro estado emocional e recebe o nome de “cuidado” ou “zelo”, porém o comportamento desconfiado e que maltrata o ser amado não quer dizer cuidado, quer?
Muitas vezes adultos incongruentes foram crianças reprimidas por seus pais ou educadores. Tornaram-se indivíduos indecisos e com baixa na autoestima, não se achando capazes para suas conquistas. Quanto maior incongruência, portanto, aumenta-se a soma de conflitos psicológicos, em especial a ambivalência como as do tipo “eu odeio este emprego, mas preciso dele!” ou ainda “minha família me sufoca, mas não entendo o porquê de eu permitir isso, porém meu desejo mesmo é o de chutar o pau da barraca…”. Situações como estas tendem a levar o indivíduo a aumentar a sua ansiedade, tornando-a patológica.
Não se deve, porém considerar toda pessoa incongruente como sendo leviana ou consciente no que faz ou sente, pois ela pode simplesmente agir assim por falta de referencial. Eis o porquê da proposta de Rogers da terapia ser Centrada na Pessoa.
Neste contexto, também a religião cristã teve uma negativa contribuição a dar quando ensinou ao Homem “pecador” a ser “bonzinho” na Casa de Deus, voltar a pecar durante a semana e retornar arrependido no domingo para confessar. Criaram uma sociedade de recalcados, culpados e, por isso, ansiosos, o que gerou um emaranhado de conflitos entre ser e aparentar. Mas, enquanto isto, escolhemos a melhor fantasia para brincar o carnaval durante todo o ano. Isto implica também dizer que quanto mais máscaras usamos mais nos tornamos alienados. “Isto é o que, em nossa opinião, constitui o estado de alienação de si. O indivíduo faltou com a sinceridade consigo mesmo” (ROGERS apud FADIMAN; FRAGER, 1986).
Quando, então, obrigamos alguém ou este se sente pressionado a expressar o que não sente, ou o pior: o oposto do que sente, além de se tratar de uma autoanulação, que custará caro ao seu psiquismo, neste momento surge o processo de alienação. Assim o indivíduo criará uma falsa autoimagem. Neste ritmo poderá ocorrer o quê? Aumento da ansiedade, crises de pânico, atitudes incongruentes e até dissociações da personalidade. Portanto estes indivíduos ao usarem demais seus mecanismos de defesa terminam por buscar um reequilíbrio através de experiências nada saudáveis, especialmente as que foram objeto de frustração. É por isso, então, que este ciclo torna-se repetitivo, compulsivo.
Então, para Rogers, o caminho é entrar em contato consigo, experienciar-se, abandonar a rigidez, de forma que em suas escolhas não haja incongruência entre valores e bem estar psíquico, a fim de que seu contato com o Self seja algo prazeroso, uma experiência com o seu Eu sem tirar fotografias, é claro. O que de fato lhe faz bem, eis a chave… e o que lhe faz mal? Então por que repete? Isto é incongruente, não acha?
Assim estas pessoas terão maiores chances de diminuir os conflitos. Por outro lado surgirá o gerenciamento da ansiedade, desaparecendo os infelizes episódios de pânico, as sensações de incapacidade, ocorrendo um maior estado de autorrealização.
BIBLIOGRAFIA
FADIMAN, J., FRAGER, R. Teorias da Personalidade. Editora Harbra: São paulo, 1986
567 total de visualizações