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UM MÁGICO CHAMADO CRISTO!

Por mais estranhas que possam parecer as histórias maravilhosas que giram em torno de grandes personalidades, como Buda, Lao Tsè, Apolônio de Thiana, Jesus e outras, elas devem ter no mínimo uma explicação lógica.

Quando estas passearam de boca em boca pela sociedade receberam um agravante, a influência dos aspectos sociais, religiosos e culturais de cada região, distorcendo-as ainda mais. Em verdade, sob o ponto de vista da Antropologia, as lendas não nascem do nada ou de coisa alguma, mas de algum fato que lhe deu origem, mesmo que este fato em nada mais se pareça em essência com a narrativa que recebeu o contato do público.

Colocando Jesus sob as investigações históricas nunca é demais lembrar que o mito, por mais que esteja destituído de explicações racionais, mesmo assim, os pesquisadores o consideram como portador de uma verdade, ou seja, ele carrega fatos e mensagens que até a própria História ignora.

Com os evangelhos e suas narrativas acerca de Jesus, isto não deixou de ocorrer. São muitas as lendas, os exageros que foram conferidos a certos momentos de sua vida, e mesmo quando o cristão não consegue explicação para o que não entende, ele acessa a imaginação e encontra a “sua verdade”. Há quem tente, por exemplo, explicar a entrada de Jesus no templo em Jerusalém, quando ele agita o ambiente com gritarias e empurrões, desta forma: “tudo isto ocorreu graças ao poder de seu magnetismo, pois ele não tocou em ninguém, era o poder de seu magnetismo, a sua energia”. Para esta pessoa, atenta em defender a sua verdade, Jesus não tocou em ninguém, pois o que causou aquela confusão enquanto derrubava cambistas, gritava, expulsava os vendilhões e enxotava os animais, foi, simplesmente, o seu poder magnético.

Mas será mesmo que tal magnetismo que a tantos curou seria também associado à destruição? Não seria mais simples admitir a indignação, a insatisfação, uma postura enérgica, com as devidas proporções em torno da violência? É claro já que se tratava de um homem pacifista. Mas não seria por ser pacifista que ficaria emudecido, seria? Uma coisa é certa: ele fez algo que causou escândalo ali dentro! Ah, isso ele fez! Na opinião quase unânime dos pesquisadores do Jesus Histórico ele teve como principal acusação por parte dos judeus a agitação que realizou no Templo. E isto pesou muito para sua morte.

Em um texto apócrifo Jesus é colocado como um mágico, fazendo pássaros de barro e ao soprá-los eles ganham a vida e saem voando. Algo bem semelhante ao processo de criação de Deus no Gênese. Outra feita, em fuga para o Egito, Jesus, ainda um garoto, amansou dragões, andou ao lado de lobos, leões e leopardos, e todos estavam mansos. Quando sua mãe parou para descansar debaixo de uma palmeira desejou comer, mas José, seu marido, lhe disse que os frutos da palmeira estavam muito altos. Imediatamente Jesus deu ordem à palmeira e ela se curvou para Maria pegar seus frutos. Depois ainda fez com que a palmeira abrisse suas raízes e mostrasse a água que escondia por baixo da terra, e assim todos puderam matar a sede devido ao calor intenso do deserto.

Há uma lenda curiosa registrada no Evangelho Árabe da Infância de Jesus. Ela envolve Jesus em sua infância, mostrando, consequentemente, o quanto a imagem dele foi modelada, segundo os interesses de cristãos gnósticos que liam manuscritos proibidos pela Igreja. Este texto o coloca como um garoto mal educado, colérico e com quem nenhum outro gostava de brincar, pois caso o menino se enfurecesse seria capaz até de matar, como narra uma das passagens, “De outra feita, ele andava em meio ao povo e um rapaz que vinha correndo esbarrou em suas costas. Extremamente irritado, Jesus teria dito: ‘Não prosseguirás teu caminho. E imediatamente, o rapaz caiu morto’” (RANGEL, 2011).

Nos próprios evangelhos canônicos encontramos passagens tipicamente mágicas e fantasiosas. Uma delas é a maneira como Jesus convoca os discípulos dizendo-lhes, simplesmente: “Segue-me!”. Ora essa, como é que alguém vai seguir outro só porque recebeu uma ordem? Não há aqui nenhum questionamento acerca de uma possível influência de seu magnetismo social, comumente encontrado em pessoas que lidam com o público. Entretanto é preciso primeiro encontrar uma resposta dentro dos próprios evangelhos, e quando não der preferível não dar asas à imaginação se o que se deseja é conhecer quem de fato foi Jesus e como ele viveu.

Os pescadores deixariam suas redes para seguir um estranho? Como bem expliquei em meu livro Por Que Jesus? não estamos falando do canto das sereias então é importante não sairmos dos limites do bom senso. Se observarmos melhor as escrituras, Cafarnaum era bem frequentada por Yehoshú’a, e é conhecida até hoje como a cidade de Jesus, pois os evangelhos narram que ele não era bem aceito em sua comunidade, Nazaré, como se observa em Mateus 13:57. Além disso, há de se levar em conta a necessidade imperiosa de se deslocar para outras cidades a fim de procurar emprego, prestar seus serviços de construtor de casas e de carpinteiro, afinal o filho mais velho de Miriam e Yussef precisava se manter e ajudar sua numerosa família. Nada mais lógico, até agora, do que o vermos residindo em Cafarnaum, inclusive com sérias chances que ele tenha passado um período de sua vida, morando com Simão, o filho de Jonas.

O lago de Genesaré ou mar da Galileia lhe era familiar. Cafarnaum está às margens deste mar de água doce e verde. Ali, Jesus teria ficado conhecido. Seus amigos, pescadores analfabetos, deveriam conhecê-lo para atender-lhe o convite de acompanhá-lo em sua jornada um tanto desafiadora, o que é muito diferente do que desejam insinuar os evangelhos de que eles estavam a obedecer a um general que está convocando seu exército para iniciar uma rebelião armada, conforme se lê em Marcos 3: 13-19.

Os tornados pescadores de alma não fazem parte de uma plateia circense, tão pouco são os representantes das doze tribos de Israel. São, em verdade, indivíduos infantis e sofridos que se multiplicavam em dezenas. Não o compreendiam na intimidade, nem conseguiam examinar a profundidade de seus gestos nem de suas palavras. Suas reflexões não os alcançavam, mas, mesmo assim, ele se permitiu andar, trabalhar, comer ao lado deles, e tentar fazer uma Israel menos sofrida para se viver. E isto não é mágica… É atitude!

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