Anterior

A MAGIA ATRAVÉS DOS TEMPOS

O presente artigo trata-se de uma pesquisa bibliográfica e de campo. Não visa questionar as manifestações religiosas, muito menos vilipendiar a vivência da religiosidade. O estudo foi desenvolvido para comparação e análise das diferentes formas de ver o “invisível” e de como o Homem com o passar dos séculos vem se relacionando com o que ele chama de magia, de místico, de espiritual ou até mesmo de herança cultural. Ainda que respeitando o anacronismo entre o passado e o presente, é cabível uma reflexão aprofundada de como alguns indivíduos não apenas se refugiam nas religiões e em suas manifestações, mas como ainda a apreciam e com finalidades muitas vezes contrárias aos princípios ético-morais difundidos por elas.

Desde a Antiguidade, passando pela Idade Média e chegando à Pós-Modernidade, o Homem sempre recorreu aos artifícios “sobrenaturais” para conquistar algo que naturalmente o esforço, a razão e o bom senso não lhe concederiam. As bruxarias, as mandingas, as feitiçarias, a magia e as macumbas foram e são amplamente utilizadas como supostas tentativas fáceis de enveredar pelos caminhos da posse, da sorte, das paixões, das traições, das doenças, das trapaças, e até dos assassinatos.

No Egito ao identificar escrituras do Livro dos Mortos (1982) em vários sarcófagos, observou-se a preocupação direta do texto com a entrada do morto no Além. Levando em seu corpo, durante o processo de embalsamento, o morto possuía fixos as suas vestes pequenos amuletos em rubi, esmeralda e pedras semipreciosas que serviam como sinal de sua importância social, proteção e oferenda na hora do julgamento.

Uma de suas iniciativas ao chegar ao além seria adquirir de imediato a proteção de estatuetas mágicas a fim de que estas acatassem as ordens dele. “Oh! Tu, estatueta mágica, escuta-me! Fui convocado e condenado a executar trabalhos de toda espécie, esses que os Espíritos dos mortos são obrigados a fazer no Além; sabe, pois oh! Estatueta mágica: que já possuis préstimo, deves obedecer o homem em sua necessidade.”

Afrodite Deformada

Na Grécia as pesquisas revelaram o interesse da consulta aos oráculos e videntes. Conhecidos mais como sensitivos estes eram procurados com a finalidade de se conhecer o futuro, buscar previsões acerca, inclusive, se este ou aquele momento era propício às batalhas. Da mesma forma que ocorria no Egito, eram utilizadas estátuas que deveriam reunir nelas o desejo de alguém que buscava uma oportunidade para se realizar, mesmo que fosse às custas do sofrimento alheio.

Afrodite, por exemplo, a deusa do amor, sempre foi muito procurada como aquela que concede favores dos mais simples aos mais complexos. Levando-se em conta a percepção do Homem acerca do divino, consequentemente, a divindade estava impregnada de sentimentos e desejos humanos.

Para uma mulher tomada pela inveja ou pelo sentimento de vingança que desejasse lançar uma maldição sobre outra, a quem ela via como concorrente, era simples. Esta utilizava uma imagem de Afrodite, porém esta estatueta não era bela e nem possuía um corpo escultural, mas era feia, gorda e com o rosto envelhecido, nada atraente para os atenienses ou espartanos. Com essa imagem era feita uma mandinga à semelhança do que popularmente ficou conhecido como “jogar uma praga”.

Essa feitiçaria servia para que a mulher perseguida acreditasse que ficaria com o corpo igual ao da estátua. A estatueta nada agradável a nenhuma mulher que gosta de se cuidar, era um insulto à vaidade e à autoestima, e aquela preocupação terminava por deixar a vítima perturbada, portadora de uma monoideia obsessiva, redundando por cumprir com o objetivo da maldição, afastar a concorrente.

Entre os romanos, em pesquisas realizadas na pequena cidade de Bath na Inglaterra, também estudamos o que se chama de indícios de bruxaria e poderes curativos. Bath foi uma antiga província romana conhecida como Aquas Sullis, e está situada, atualmente, no Condado de Somerset, cerca de 187 Km à Oeste de Londres. Patrimônio Cultural da Humanidade, a cidade ficou famosa entre os romanos por suas águas termais. Os romanos acreditavam que as águas quentes eram uma oferenda dos deuses e cerca de um milhão de pessoas que visitam, anualmente, Bath creem em seu poder curativo.

Porém através dos estudos da Geologia sabe-se que as águas passam por fendas em rochas calcárias em uma profundidade de mais de 3000 mil metros. As águas provêm das chuvas que caem em outras localidades e são levadas abaixo da crosta terrestre, sofrem uma pressão de 64° C e chegam à superfície das termas de Bath a uma temperatura de 46° C. Tudo natural, nada de presente dos deuses como pensavam os romanos.

Não muito diferente de alguns episódios infelizes estampados nos jornais atuais das grandes cidades acerca de homens que tiveram seus órgãos mutilados devido ao fato de muitas mulheres ao se sentirem enganadas e traídas tomaram atitudes impensadas e insanas.

Curiosamente no local destinado ao lazer e às curas foram encontradas pequenas lâminas de metal (foto abaixo) com inscrições destinadas às maldições. O material estudado confere informações muito fortes. A maior parte dessas bruxarias foi feita por mulheres e carregam palavras cheias de vingança endereçadas aos homens que as traíram. São desejos chocantes que incluem desde a impotência sexual até a perda da genitália masculina, escritos explicitamente nas palavras “desejo que caia!”.

Não muito diferente de alguns episódios infelizes estampados nos jornais atuais das grandes cidades, acerca de homens que tiveram seus órgãos mutilados, devido ao fato de muitas mulheres ao se sentirem enganadas e traídas, tomaram atitudes impensadas e insanas.

É bom lembrar que não menos importante foi o sincretismo que também ocorreu tanto na América do Sul quanto na Central. A cultura material encontrada nestas regiões data como pertencente à época pré-colombiana. Do mesmo jeito que a Igreja aliou-se ao Estado na Idade Média, tal aliança também se deu desde a colonização espanhola na América, trazendo a influência católica, porém houve uma adequação à cultura local, como é o caso do México em relação à Nossa Senhora do Guadalupe, não representando apenas uma suposta Santa Católica, mas em verdade reverenciando uma antiga divindade asteca. (1954).

No Haiti, atualmente, a religião ligada ao Estado é o Vodu. Um misto de crenças africanas e cristãs, onde até mesmo o chefe de Estado é visto como um portador de poderes sobrenaturais. Os loas, que são os espíritos bons e maus, manifestam-se por meio dos hogans que são os atuais feiticeiros. A mulher, também, tem papel predominante, pois é responsável pelos ritos. Estes incluem a matança de animais relacionados aos dias dos loas.

No Brasil colonizado pelo catolicismo português e miscigenado ao paganismo indígena e africano, se multiplicam até hoje as práticas definidas como magia. Conhecidas e difundidas pelo Candomblé ou pelo Xangô os despachos, os tratamentos espirituais, acompanhados de rituais como banhos, oferta de animais, flores, frutos, e concorrendo nesta perspectiva com os que se arvoram como detentores do conhecimento dos trabalhos de goécia, como a magia negra, envolvem pessoas de diferentes níveis culturais e econômicos em suas realizações.

Entretanto algo geralmente não é observado, tão pouco levado em conta no quesito necessidade de amparo. Sob a ótica da Psicanálise o comportamento histórico é revisto, ampliado e detalhado no que diz respeito à análise do que se encontra por trás de tais motivações pessoais.

Indivíduos de personalidade infantil, pouco amadurecidos, transferem como crianças suas frustrações com desejo de se fazerem presentes ou de simplesmente serem lembrados no sofrimento do próximo. A infância psicológica na qual tais pessoas estão encarceradas torna-as prisioneiras de suas escolhas mentais e dos próprios desafetos que carregam. “Alguém” ou “alguma força” sobrenatural no Universo precisa socorrê-las em seus desesperos quando se sentem abandonadas, trocadas. Sem se esquecer de que a busca por tais práticas envolvendo estatuetas e amuletos sempre conferiu ao seu portador, ao longo da história das batalhas, um poder que não lhes pertence, mas que criam possuir. E assim, inconscientemente, conseguem escamotear, até hoje, complexos como o de inferioridade.

Tomadas pelo caráter da covardia moral, impulsivas e narcisistas, têm o orgulho ferido e vociferam provocações, insinuações, difamações e calúnias. Pouco satisfeitas em suas carências recorrem às crenças de civilizações antigas ou até mesmo dos períodos tribais assinalados pela presença das hordas primitivas.

A necessidade de um Pai superprotetor que deveria acolhê-las em seus caprichos revela, também, desejos de vingança e destruição. Enquanto serve como liberação de comportamentos autodestrutivos as são observadas, também, a ideação persecutória obsessiva sociados aos estados mentais depressivos e paranoidesem quadros tanto neuróticos quanto psicóticos, onde o objeto desejado, amado, e vale salientar inalcançável, muitas vezes passa a ser alvo de frustração e consequentemente de ódio.

Geralmente, são pessoas que não sabem perder para elas mesmas, nem compreendem que a vida é feita de perdas e faltas. Não assumem suas responsabilidades perante seus próprios fracassos e buscam mecanismos de fuga nas ilusões do místico e tornam-se cada vez mais infantis, e não menos problemáticas.

BIBLIOGRAFIA:

O Livro dos Mortos do Antigo Egito. Tradução de Edith de Carvalho Negraes. São Paulo: Heums, 1982.

RODRIGUEZ, J.; FORTIER, T. Cultural Memory: Resistence, Faith and Identtity. Austin: University of Texas Press, 1954.

Loading